terça-feira, 28 de outubro de 2014

É o fim do caminho...

Olha, eu vi muita coisa nesse Facebook nos últimos tempos e permaneci calado. Entre elas, pessoas reclamando do Bolsa Família morando no estado mais industrializado do Brasil.

Em primeiro lugar; sou paulistano com orgulho, tenho formação acadêmica (o que não me faz ser melhor que ninguém - também não acredito me adequar ao que chamam de "Bacharel analfabeto"), já passei dos 25, não dependo dos meus pais, nunca usufruí de nenhuma bolsa auxílio... Sou filho de nordestinos que vieram para São Paulo buscar oportunidades e aqui fincaram suas raízes.

Agora eu lhe proponho; vá até uma cidade do interior de Alagoas chamada Inhapi (cerca de 3 a 4 horas de Maceió), adentre pelos sítios perdidos na seca, onde sequer celulares pegam e tente entender o que é o nosso país.

Há alguns anos desembarquei lá por força maior e me deparei com um local esquecido no meio do mundo, onde o acesso é difícil, a cidade grande é longe e mesmo lá não tinha emprego suficiente para abrigar todos do estado. Lá, pessoas agradeciam aos céus por R$ 80 que recebiam e ao contrário do que muitos contam, não tinham corredores de filhos enfileirados pedindo esmolas. Eles se valiam da ajuda que permitia colocar parte do alimento sobre a mesa e poder sim investir na sua humilde plantação de milho, mandioca ou feijão de corda - que muitos devem conhecer apenas das saborosas casas de comida típica.

As crianças estudavam em escolas de fraco preparo, mas ao menos tinham o privilégio de aprender a ler e escrever. Opa, estou me antecipando, eles tinham a graça de não morrer antes de completar um ano de vida.

Médicos para diagnosticarem doenças já surgiam aos poucos (mesmo que muito pouco - bom lembrar que também por aqui o sistema público de saúde é tenebroso), pois era de costume até então desconhecer o que era isso. Quando alguém, não importava a idade, sucumbia por algum mal estar, o diagnóstico era o mesmo; morreu de doença. Qual doença? Ninguém fazia ideia.

Quantos parentes meus se foram desta mesma maneira... “Quem é fulano?”, “Ah, morreu.”, “Mas morreu de quê?”, “Oxi, de doença”...

A coisa estava difícil e acreditava que aquilo não podia ser pior, mas o povo sorria, pois já não morriam de fome. Um luxo e tanto. E vou contar uma novidade; todos trabalhavam e a grande maioria depositava nos filhos mais velhos a esperança de ter um avanço na vida ao vê-los completando os estudos... que coisa, a maioria sequer sabia assinar o nome até bem pouco tempo atrás.

Água encanada ainda não havia, mas o caminhão pipa e a cisterna financiada pelo governo evitavam a sede. Cada casa tinha um ponto de luz e uma TV de tubo colorida era uma alegria e tanto...

O Brasil é um país qual a falta de cultura prejudica bons hábitos. Por aqui arte, música e outras tantas coisas são apenas artigos descartáveis que pouco importa.

Em São Paulo, quem se formou em qualquer coisa vira e diz; “Vocês estão vivendo às minhas custas” - dando as costas e pagando com sorrisos seus impostos.

Bom lembrar que poucos teriam a condição de usufruir a vida que têm hoje de casa própria, carro na garagem, cinema no fim de semana, tecnologia jorrando por todos os lados numa alegre e confortável vida de classe média.

Eu sou católico e a fé não vem apenas de obediência (inclusive acho patético ver membros da igreja, até mesmo – ou principalmente - sacerdotes, pregando preferências eleitorais e demonizando o outro lado com discursos de ódio inflamados). Oh Deus, onde está o amor, o respeito e a contrição?

Não votei no Aécio pois não acreditei em suas propostas, mas também não votei feito um idiota na Dilma. “Ah, Marcos, mas e a corrupção?”. A corrupção no PT é abominável e espero que seja coagida com rigor – eu aplaudi o STF e ainda achei pouca a punição aos mensaleiros. Porém é bom lembrar que incompetência e desvio de dinheiro também acontecem no PSDB e em todos os outros partidos políticos, a única diferença é que casos de cartel do metrô, helicóptero com cocaína e falta d’água – onde a culpa aqui é só de São Pedro – não viram capa da Veja!, não ganham destaque na Folha de S. Paulo e nem um bloco inteiro no Jornal Nacional.

Precisamos sim correr atrás de justiça e combater a corrupção, mas vamos com calma e respeite a opinião alheia e analise os fatos. Se você tem condições de viajar para o exterior e abandonar o país, alguém perto de você pode não ter essa mesma ‘felicidade’.

Caso o 45 tivesse ganhado, e por pouco não ganhou, o mundo não mudaria da noite pro dia. Talvez fosse realmente melhor do que o governo atual, mas quem sabe não.

Por favor, respeitem-se (todos os lados – vermelhos, azuis, seja lá o que for). Se você está no governo, parabéns! Caso não, que a oposição seja firme e democrática.

Caso contrário, que bela revolução vai acontecer!

Não existiria Dilma se não fosse Lula, que por sua vez jamais existiria caso não houvesse FHC que também não teria dado as caras se por sinal o Neves (o avô) também não tivesse entrado nessa batalha. Quem sabe daqui a 4 anos o quadro não se inverta de novo e boa sorte ao nosso Brasil. Que assim seja!

Ah, não vamos dividir o país ao meio... isso é nojento...

Marcos Ferreira Silva

segunda-feira, 23 de junho de 2014

Rotina


Para Sabrina da Cruz

Acordo e olho à minha volta. Sono. Ela está deitada ao meu lado. Sorriso estampado, cabelos bagunçados. Linda. “Bom dia, bebê!”, ela diz estendendo a mão em minha direção. Entrelaça os dedos seus nos meus e me puxa. Com a outra faz carinho em meu rosto. “Te amo!”, ela fala. “Também te amo, e muito”, eu respondo.
Nos abraçamos por alguns minutos. O sol adentra pela janela, esquentando o quarto. Levanto e vou até o banheiro. Ela continua deitada. No meio do meu banho, ela surge. Empurra a porta do box e me domina. Os olhos grandes, ávidos. Não fala nada. Nem precisa.
A água quente escorre na epiderme, deixando um delicioso tom avermelhado. Nos desfazemos da cortina de vapor e voltamos ao quarto. Nos arrumamos. Ela se pinta e se perfuma, maquia e se penteia. Me apresso, vou para a cozinha. Olho para o relógio. “Ah, ainda dá tempo”, digo em pensamento.
Enquanto o rímel corre pelos cílios, preparo o café, o suco. Quase em silêncio. Estamos com poucas palavras, nos entendemos com o olhar. Antes dela terminar, chego com a bandeja e ela ri. “Café na cama? Mas eu não estou mais deitada!”. “Não importa”, retruco. Os lábios se tocam. Ela para o que está fazendo e prova o que fiz especialmente para minha princesa.
Sorriso bobo, parecido com um soluço. Os dois. Ela lembra aquele dia na Copa do Mundo. “Dancei com a sua bandeira do Brasil”, ela ri alto. Os meus dedos descem pelo rosto dela. “Te amo!”, eu digo desta vez. “Eu também te amo, meu cabritinho!”. Faço muxoxo. “Cabritinho?”, resmungo, mas já fazendo uma cara idiota para ela rir de novo.
A manhã segue. Limpamos a casa ao som das minhas músicas. Ela gosta, mas impõe seus gostos. Eu me surpreendo. Até que é legal. Cantamos e dançamos na sala. O dia ensolarado. “Quero sair!”, ela declara. “Para onde, amor?”. “Ah, não sei. Escolhe você. Eu já disse que queria sair”. Percebo que não me restam alternativas. Deixamos o preparo do almoço e vamos explorar o mundo.
Andamos um pouco à toa pelo parque de mãos dadas. As pessoas reparam e sorriem quando nos avistam na rua. Sentamos no banco. Começo a falar de futebol e rock, de algumas histórias do passado. Ela gosta, até que extrapolo a falar demais. Coitada, se entedia. Mudamos o assunto e compramos um sorvete. Nos lambuzamos todo. Rimos ainda mais um pouco. Voltamos para casa.
Ela abre a porta. Falo em seu ouvido para que vá até o quarto e abra a segunda gaveta da cômoda. Não entende muito bem, mas atende o meu pedido. Os pássaros cantam felizes. O almoço seria comprado por telefone. Era nossa folga do mundo. Sigo seus passos até o dormitório. Me contento em assistir ela abrir a gaveta e se deparar com o embrulho.
Reparo em seus olhos cheios d’água. Ela vem e me abraça. Uma menina. “Adorei! Te amo!”. Ela me beija acidamente, empolgada. O sabor das lágrimas parecem doces naquele momento. Ela diz que tem algo para mim também. Eu fico feliz e digo. “Você nunca esquece, né?”. “Não, nem você”. Apertamos o abraço.
Eu olho para a minha mão enrugada sobre o ombro dela, branco e cheio de pequenas e doces manchinhas. “Pô, a gente está casado há tantos anos. Temos netos casados. Como se lembra?”, eu falo. Ela responde com um sorriso terno. “12 de junho, meu velhinho. Feliz dia dos namorados”.
Marcos Ferreira Silva

quinta-feira, 1 de maio de 2014

Apenas um

Dois anos...
E nove meses...
Respirei fundo e olhei para tudo à minha volta. As paredes, o guarda-roupa, o violão, a revista, a TV ligada, o rádio em silêncio e o livro ao lado da cama. Peguei, folheei. Fui levado por uma lufada de pensamentos. Era o presente dela, a pessoa mais especial que já cruzou meu caminho.
Fiquei remoendo a memória que me remetia até o dia do beijo e a velha discussão: Quem, afinal, beijou quem? – passarei todos os meus dias sustentando a mesma versão. Eu a prendi na parede e selei o início dessa união. Ela rebate. Sempre rebaterá.
Aquele dia era apenas mais um dia até aquele momento. O toque dos lábios fez a atração evoluir e nascer uma paixão, que pouco tempo depois se tornaria um verdadeiro amor.
Cá estou, dia frio. Olho para a caneca em cima da mesa. Compramos juntos naquele show, naquela noite gelada. Meus olhos se guiaram para a prateleira: o boneco do Buzz e uma guitarra aos seus pés. Sorri. Presentes dela.
Uma ideia surgiu em minha mente. Planos para uma nova vida profissional. Ideia dela. Penso no dinheiro para o carro. Oh Deus, esse carro. Um dia ele sai. A fé que nos move. Eu e ela. E a casa? Ah, a casa. Me flagro sonhando com o cantinho nosso. As paredes brancas e salmão. As nossas coisas. A vida futura. Estará tudo lá, do jeito que sonhamos. Posso apostar. A cama macia, o nosso reino.
Sou assaltado por outro pensamento. A porra do livro! Preciso terminar de revisar a porra do livro (assim que trato carinhosamente minha obra literária). Parei por um instante. Se não fosse ela, eu não teria terminado. As ideias do próximo nascem quando estou com ela. O sorriso de canto surge mais uma vez.
Sinto um calafrio. Vestígios de uma febre. Lábios ressecados, dor no corpo. Vasculho a gaveta de remédios, atônito atrás da cartela de antigripal que um dia ela me indicou. Volto e me jogo na cama. Aquele lençol vermelho com listras e o travesseiro quase infantil, heranças de um tempo de criança que não me abandona em alguns momentos. Foi ela quem disse isso.
Desligo a TV que estava passando uma entrevista com o ator preferido dela e ligo o rádio. A música que ela ama. A banda que ela nunca lembra o nome. Quando a canção termina, mudo para o MP3, toca uma outra que diz: “O mundo é pequeno sem ter com quem dividir as coisas banais”. Me apego ao trecho e viajo em pensamentos. As cócegas, as risadas, as caras e bocas que só divertem a nós. O nosso código, o segredo.
Esfrego os olhos. Sinto a aliança roçar em meu rosto. O sorriso me domina pela enésima vez. As pálpebras se fecham e lembro-me de seu sorriso, seu olhar inquieto. Íris ávida. Sinto a paz. O mundo em detrimento ao nada e eu sorrindo.
A vida é ela. Tudo à minha volta já a pertence. Somos um...
Marcos Ferreira Silva