segunda-feira, 23 de junho de 2014

Rotina


Para Sabrina da Cruz

Acordo e olho à minha volta. Sono. Ela está deitada ao meu lado. Sorriso estampado, cabelos bagunçados. Linda. “Bom dia, bebê!”, ela diz estendendo a mão em minha direção. Entrelaça os dedos seus nos meus e me puxa. Com a outra faz carinho em meu rosto. “Te amo!”, ela fala. “Também te amo, e muito”, eu respondo.
Nos abraçamos por alguns minutos. O sol adentra pela janela, esquentando o quarto. Levanto e vou até o banheiro. Ela continua deitada. No meio do meu banho, ela surge. Empurra a porta do box e me domina. Os olhos grandes, ávidos. Não fala nada. Nem precisa.
A água quente escorre na epiderme, deixando um delicioso tom avermelhado. Nos desfazemos da cortina de vapor e voltamos ao quarto. Nos arrumamos. Ela se pinta e se perfuma, maquia e se penteia. Me apresso, vou para a cozinha. Olho para o relógio. “Ah, ainda dá tempo”, digo em pensamento.
Enquanto o rímel corre pelos cílios, preparo o café, o suco. Quase em silêncio. Estamos com poucas palavras, nos entendemos com o olhar. Antes dela terminar, chego com a bandeja e ela ri. “Café na cama? Mas eu não estou mais deitada!”. “Não importa”, retruco. Os lábios se tocam. Ela para o que está fazendo e prova o que fiz especialmente para minha princesa.
Sorriso bobo, parecido com um soluço. Os dois. Ela lembra aquele dia na Copa do Mundo. “Dancei com a sua bandeira do Brasil”, ela ri alto. Os meus dedos descem pelo rosto dela. “Te amo!”, eu digo desta vez. “Eu também te amo, meu cabritinho!”. Faço muxoxo. “Cabritinho?”, resmungo, mas já fazendo uma cara idiota para ela rir de novo.
A manhã segue. Limpamos a casa ao som das minhas músicas. Ela gosta, mas impõe seus gostos. Eu me surpreendo. Até que é legal. Cantamos e dançamos na sala. O dia ensolarado. “Quero sair!”, ela declara. “Para onde, amor?”. “Ah, não sei. Escolhe você. Eu já disse que queria sair”. Percebo que não me restam alternativas. Deixamos o preparo do almoço e vamos explorar o mundo.
Andamos um pouco à toa pelo parque de mãos dadas. As pessoas reparam e sorriem quando nos avistam na rua. Sentamos no banco. Começo a falar de futebol e rock, de algumas histórias do passado. Ela gosta, até que extrapolo a falar demais. Coitada, se entedia. Mudamos o assunto e compramos um sorvete. Nos lambuzamos todo. Rimos ainda mais um pouco. Voltamos para casa.
Ela abre a porta. Falo em seu ouvido para que vá até o quarto e abra a segunda gaveta da cômoda. Não entende muito bem, mas atende o meu pedido. Os pássaros cantam felizes. O almoço seria comprado por telefone. Era nossa folga do mundo. Sigo seus passos até o dormitório. Me contento em assistir ela abrir a gaveta e se deparar com o embrulho.
Reparo em seus olhos cheios d’água. Ela vem e me abraça. Uma menina. “Adorei! Te amo!”. Ela me beija acidamente, empolgada. O sabor das lágrimas parecem doces naquele momento. Ela diz que tem algo para mim também. Eu fico feliz e digo. “Você nunca esquece, né?”. “Não, nem você”. Apertamos o abraço.
Eu olho para a minha mão enrugada sobre o ombro dela, branco e cheio de pequenas e doces manchinhas. “Pô, a gente está casado há tantos anos. Temos netos casados. Como se lembra?”, eu falo. Ela responde com um sorriso terno. “12 de junho, meu velhinho. Feliz dia dos namorados”.
Marcos Ferreira Silva