segunda-feira, 7 de março de 2011

Há muito tempo atrás

(Texto produzido em novembro de 2010 – resgatado da lixeira do computador)
Hoje vai acontecer aqui em São Paulo o show do Sir Paul McCartney. É impressionante ver como as pessoas se emocionam e se jogam nos braços da loucura com a vinda do velho beatle. Em tempos assim, a TV mostra matérias sobre a vinda do ídolo, a histeria dos fãs e, o que eu mais gosto; imagens de arquivos.
A gente fica meio ‘abobado’ quando vê os quatro rapazes de Liverpool sendo seguidos por garotas ensandecidas, admirados por garotos de todo o mundo e respeitados por todos os senhores e senhoras que os assistiam de suas poltronas.
Pensar que eles eram quase crianças. Com seus poucos 18 anos eram donos de uma carreira e um talento único.
Enquanto lia uma revista, vi que na inauguração da cidade de São Paulo, no famoso pátio do Colégio, o tão estudado José de Anchieta ainda era um rapazote de 19 anos.
Hoje, estava vendo alguns títulos numa livraria e me deparei com uma biografia de Arthur Rimbaud e enquanto folheava as páginas, com o agradável cheiro de livro novo, descubro que suas obras mais significativas foram escritas antes dos 20 anos. No auge da minha ignorância, não sabia dessa informação. Não sabia, mas podia imaginar. Álvares de Azevedo, Jim Morrison, Renato Russo e até Jesus Cristo eram novos durante o ápice de suas vidas ou carreira.
Acho que a juventude é enigmática. O jovem é dono de uma força e uma expressão que em nenhuma outra época ele dominaria. Tenho a impressão de que Deus sopra em alguns cantos uma inquietação fora do habitual e cria seres fantásticos, únicos em uma linhagem.
Não acho que sou dono deste talento, mas, como vários jovens, tenho boas histórias pra contar.
Quando tinha 14 anos, resolvi, por puro interesse, tocar na paróquia perto de casa. Ressaltamos que Deus é muito ágil e fez desse meu abuso um fato lindo. Lá formei amizades inacreditáveis e juntei velhos amigos numa só equipe e, acima de tudo, me construí gente com sentimentos de alegria, amor e até o desgostoso ressentimento.
Eu era só um garoto que sabia tocar violão e amava os Beatles, os Rolling Stones e a Legião Urbana.  E não suportava as músicas que tocavam lá na igreja de acústica admirável. Tudo muito paradoxal, eu sei, mas era realmente assim. Eu queria tocar lá, não sabia exatamente por qual razão.
Lembro que minha primeira missa foi um desastre – para mim, porque para os demais de nada importavam, pois meu violão estava desligado.
Com o tempo, migrei de grupo umas duas vezes até que surgiram três garotas que cantavam razoavelmente mal, mas uma delas era minha paixão – talvez um amor fulminante – e com esse argumento e mais a possibilidade de tocar minha esquecida guitarra eu fui. Não podia ter feito escolha melhor.
O tempo foi passando e fomos ganhando forças. As três garotas de vozes que se modelavam perfeitamente com o tempo, e o esforço e a companhia de dois modestos instrumentistas (eu e um amigo irmão) de pureza e criatividade sem igual, nos modelamos.
Sem perceber, viramos perfeccionistas ao extremo. Ensaiávamos 5, 6, 7 horas para uma missa. Cada domingo era uma data importante e os sábados nós tratávamos o salão da igreja como um estúdio abençoado. E era mesmo. Tinha tudo que precisávamos e de qualidade. Além disso, nos sentíamos tão seguros e certos do que estávamos fazendo. Uma coisa que só a sabedoria de Deus poderia explicar.
Acabamos fazendo escola. Os ensaios dos demais grupos, que já não eram curtos, ficaram ainda mais longos. Algumas vezes abríamos a igreja umas 2, 3 da tarde e a fechávamos já de madrugada. Ensaiando ponto a ponto de uma canção, tentando modelar a música de um jeito não para nos agradar, mas para ficarmos radiantes. 
Terminávamos felizes e morrendo de ansiedade para no dia seguinte irmos chegando logo cedo na igreja um a um. Com amontoados de letras, cifras e partituras, montávamos o som e passávamos música por música. Era uma verdadeira insanidade sonora... Não pergunte a ninguém que lá tocava o segredo de tudo aquilo. Tinha um jeito natural fora do comum.
Os dedos desciam pelo braço do violão. A palheta tocava corda por corda sem errar. O baixo deslizava suave. A bateria era leve e imponente. E as vozes estavam afinadas e vibrantes. Deus estava operando...
Hoje, anos depois, não me sinto tão vivo quanto antes. Bem provável aquela facilidade toda tinha prazo curto de validade. Ainda sou jovem, mas a essência para aquilo dependia de mais. Apenas de 14 ou 17 anos. Só isso.
A magia de tudo aquilo nunca saberei explicar.
Marcos Ferreira Silva

Um comentário:

  1. Obrigada pelo "razoavelmente mal" ..aahushahsa

    Era mto ruim no começo..ashahsau

    Me deu saudades da força que era nesta época, escola de música eu tive a minha...ashahsua

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