domingo, 26 de abril de 2015

Vá, mas volte logo

“E quando eu for embora não... não chores por mim”...

Aprendi com as canções da Legião Urbana que sentimentos não deveriam ficar guardados, enterrados no peito para uma alegria ou sofrimento solitário. Sempre expus o que me alegrava ou maltratava meu coração.

O tempo e o medo me fez perder aquilo que eu mais prezava; transformar fosse lá que fosse em arte. A tristeza passou a bater em minha porta, receber licença para entrar e jamais sair. Perdi o dom de materializá-la, de metamorfoseá-la, de lhe dar a chance de ser algo maior e melhor.

A evolução do pranto morria e consigo parte de mim. Recluso num universo de paredes negras, a poesia sumia. Sucumbia em meio ao nada. De que valia então sofrer? Ninguém sofre por razões de interesse, mas, se a dor não é opcional, faça dela algo útil.

É como arroz velho na geladeira. Aquele qual o gosto já não é mais o mesmo e seu desejo é jogá-lo fora, despejar com panela e tudo no lixo, mas a lembrança da fome e o mínimo de bom senso o impede de fazer aquilo.

Perdido, sem saber o que fazer com pelo menos um quilo do cereal mais popular do planeta, você começa a procurar outros elementos esquecidos no refrigerador, junta um pouco de temperos novos, refoga tudo, talvez até crie um molho especial e “voilà”, há um prato saboroso sobre a mesa.

Meu pai foi chefe de cozinha por muitos anos e me ensinou que nada deve ser jogado fora, tudo pode ser aproveitado. E qual o motivo de não fazermos isso por nós? Às vezes o que nos machuca é o que nos falta para libertar de algo, basta olhar com uma ótica diferente.

Em inúmeras vezes me vi, ao menos em pensamentos tortos, em cima da ponte, pronto para me atirar, entregue aos anjos dispostos a me levar para as baixas temperaturas, quase européias, lá do alto do céu, ou para as profundezas quentes, meio cariocas, do inferno.

Quem me deu a mão e me salvou foi a bosta da luz vermelha que tornou a ficar verde na hora “H”, anunciando que eu deveria voltar. Em tantas vezes as lágrimas foram mais fortes que a própria sanidade. Vendo o mórbido filme ter um final feliz, ao menos naquele momento, eu jamais me propus explicar aos mortais como o piscante pontinho de luz funcionava e nem porque raios era melhor não acioná-lo.

Perdido no pranto agônico, o melhor é olhar para frente. Pode chamar essas linhas mal escritas de auto-ajuda de quinta. Sim, é auto-ajuda. A ajuda que me permitiu estar vivo e navegando no oceano sem sentido de Jorge Amado... as letras.

Se você quer morrer por alguns instantes, eu não vou te impedir, mas tome cuidado. Apague a mente, mas não fique perto da ponte, nem de carros ou parapeitos. Se afaste o máximo possível de facas e armas de fogo. Morra apenas para o mundo e os problemas. Até se isole, mas não demore em pedir um sorriso novamente. Vá, mas volte logo.



Marcos Ferreira Silva

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